eu sei que, pela lei dessa alteração, eu recorro ao ruim e esse cérebro - um quebrado e ridículo gelatinoso - irriga e irriga. tornando mais nítido, mais vívido. mais hoje o remorso.
e se continua mordendo.
como se esquecer não fosse uma opção ou questão de tempo.
refrata no corpo. cogito se alguma vez já me vi realmente, fitando de cima esse corpo como se ele eu não o fosse, arriscando os espelhos e as inconsistências que denunciam. e só há um ódio côncavo
eu só consigo contemplar o que seria e poderia ter sido
e se eu não tivesse me tornado essa massa cinzenta, amorfa, molenga e fraca, sem rosto ou chance de riso, sem os buracos dos olhos...?
e se houvesse a escolha de não berrar tão feio e incômodo
sempre que me venho à noite é àquele dia que descobri não estar grávida e você me disse que havia outro corpo. que outro corpo de mulher fora e ainda era possível. e estampou no meu a revolta por ser absurdo e incompetente. e sem poder decidir, antes de qualquer oportunidade de decidir, gritei no semi acústico daquele carro pequeno demais, subitamente encolhido. e gritei gritei com a cabeça entre os joelhos, e as mãos tentando arrancar as têmporas, os pulsos sarando - por pouco tempo. as brasas nas órbitas afundavam no crânio e era incompreensível, era insuportável, inacreditável. não era possível, não os fatos, mas que doesse daquela forma. era eu? era eu que, desgastada e natimorta, não crescera em escrúpulos e limites? ou era uma outra coisa, chamada de coisa por tão embaçada e desconhecida, me jurando que os vidros do carro eram frágeis demais pro quanto queimava e queimava, e a bile voltando mais ácida que o normal, meus olhos inchando até ocuparem toda a cara vermelha, o lá-fora distorcido e eu deformando de tanto ímpeto nunca correspondido...?
e parece que os olhos nunca secaram
e os rugidos continuam estridentes e sólidos como leões empalhados em cimento
insistem em jurar que há um mundo lá fora - eu ouço leves as batidas, espio de canto de olho a multidão passando colorida -, mas não parece possível
e meu cabelo não cresceu um só milímetro desde aquele ano porque os tempos não existem
então o sangue continua seu destino de lotar as rugas desse órgão de tropeços - e nunca cessa
como um outro coração bombeando
em inevitáveis
e sucessivos
equívocos
de obsessivos “se”(s)
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