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Mostrando postagens de junho, 2020

o cérebro não cria o homem: o "sujeito cerebral" e o reducionismo da neurocultura

o zeitgeist do século XVII trouxe consigo o reducionismo mecanicista , no qual todo humano seria explicável por mecanismos físicos. hoje, quatro séculos depois, essa posição parece não ter sido superada - e apenas atualizada através da genética e das neurociências. friso que o problema recai não no conhecimento-objeto, mas sim na tendência instrumentalizadora que reflete o autoritarismo e o sensacionalismo científicos; isso porque o termo "neuro " foi convertido atualmente em um significante mestre , ou seja, um significante que explica quase tudo, uma etiqueta de garantia de que há nisso um saber seguro. nossa fantasia de época é o sistema cibernético - e a insistência de assemelhar o cérebro a um computador, e o humano a um andróide; assim persiste a hipótese subjacente de que tudo o que somos tem sua localização : o sujeito é topográfico, isto é, insiste-se num mapping ou escaneamento que busca o humano nos neurônios e genes. então despontam milhares de teorias sobre ge...

psicopatia e julgamentos morais: evidências neurobiológicas

“psicopata” não é uma categoria descritiva, mas sim uma medida variável que se manifesta através de traços; a escala PCL-R (psychopathy checklist-revised)  de Hare lista: com relação a fatores interpessoais/afetivos : lábia/charme superficial; senso grandioso de autoestima; mentira patológica; ausência de remorso ou culpa; afeto superficial; crueldade/falta de empatia; falha em aceitar responsabilidade pelas próprias ações; comportamento sexual promíscuo; ludibriador/manipulador. com relação ao estilo de vida desviante ou antissocial : falta de objetivos realistas de longo prazo; impulsividade; irresponsabilidade; versatilidade criminal; necessidade de estimulação; estilo de vida parasita; controle deficiente do comportamento; problemas comportamentais precoces; muitas relações conjugais de curta duração; revogação da liberação condicional; delinquência juvenil. esses traços podem estar presentes desde a infância, já que a psicopatia se trata de um desvio relacionado à hereditaried...

a personalidade como-se: o borderline na clínica psicanalítica de Deutsch e Winnicott

Abordadas por Deutsch (1942) em relação à “ personalidade como-se”, as noções de falso self ganham notoriedade com Winnicott (1949/1960), sendo centrais para O Eu Dividido de Laing (1960) e utilizadas como chave para compreensão dos tipos esquizofrênicos na clínica psicanalítica. Antes de tudo, uma consideração íntima: costumo interpretar as argumentações psicanalíticas tradicionais com um certo resguardo de licença poética; isso porque se tratam de processos esmiuçados de maneira profundamente complexa, mas que não se perdem da própria lógica; apesar do caráter de pseudociência que reitero , o discorrer psicanalítico  assume um modo de prosa poética, irmanado à abordagem fenomenológica que foca no sujeito doente como existência válida. A clínica confere dignidade àquele que sofre, centralizando a totalidade da pessoa observada numa outra linguagem. A evolução sócio-histórica do transtorno de personalidade borderline lhe conferiu o título de “personalidade como-se” (tamb...